Entenda o conflito entre Rússia e Ucrânia

Entenda o conflito entre Rússia e Ucrânia

Séculos de derramamento de sangue, dominação estrangeira e divisões internas deixam a Ucrânia em uma posição delicada entre Ocidente e Oriente. Veja os pontos-chave para entender por que a região está no centro de uma possível guerra.

À medida que a ameaça de uma invasão russa na Ucrânia domina as notícias, um olhar para a longa e entrelaçada história dos controversos vizinhos revela como o palco foi montado para o conflito de hoje.

Rússia e Ucrânia: qual é o ponto histórico que as une?

A herança compartilhada dos dois países remonta a mais de mil anos, a uma época em que Kiev, hoje capital da Ucrânia, estava no centro do primeiro Estado eslavo, a Rússia de Kiev, berço tanto da Ucrânia quanto da Rússia.

Em 988, Vladimir I, o monarca pagão de Novgorod e grão-príncipe de Kiev, aceitou a fé cristã ortodoxa e foi batizado na cidade de Quersoneso, na Crimeia. Aludindo a esse momento histórico, o líder russo Vladimir Putin declarou recentemente: “Russos e ucranianos são um só povo, um único todo”.

Uma pintura do século 19 retrata Vladimir I, governante da Rússia de Kiev, o local de nascimento da Ucrânia e da Rússia, escolhendo o cristianismo ortodoxo como a nova religião do Estado em 988.

Quando começou o rompimento entre a Rússia e a Ucrânia?

No entanto, nos últimos dez séculos, a Ucrânia foi repetidamente invadida por potências rivais. Guerreiros mongóis do leste conquistaram a Rússia de Kiev no século 13.

No século 16, exércitos poloneses e lituanos invadiram o oeste. No século 17, a guerra entre a República das Duas Nações (Polônia e Lituânia) e o Czarado da Rússia deixou as terras para o leste do rio Dniepre sob controle imperial russo.

O leste ficou conhecido como a ‘Margem Esquerda’ da Ucrânia, enquanto as terras a oeste do Dniepre, ou ‘Margem Direita’, ficaram a mando da Polônia.

Mais de um século depois, em 1793, a Margem Direita (ocidental) da Ucrânia foi anexada pelo Império Russo. Ao longo dos anos que se seguiram, uma política conhecida como russificação proibiu o uso e o estudo da língua ucraniana, e os habitantes foram pressionadas a se converter à fé ortodoxa russa.

Joseph Stalin: o líder soviético que aprofundou a cisão entre Rússia e Ucrânia

A Ucrânia sofreu alguns de seus maiores traumas durante o século 20. Após a revolução comunista de 1917, o país, como muitos outros, travou uma brutal guerra civil antes de ser totalmente absorvido pela União Soviética em 1922.

No início da década de 1930, a campanha de coletivização das fazendas promovida pelo líder soviético Joseph Stalin produziu uma grande fome que provocou a morte de milhões de ucranianos.

Depois disso, Stalin importou um grande número de russos e outros cidadãos soviéticos para ajudar a repovoar o leste. Muitos deles não falavam ucraniano e tinham poucos laços com a região.

A campanha do líder soviético Joseph Stalin para coletivizar a agricultura levou à fome generalizada na década de 1930, o que matou milhões de ucranianos. No pior momento da Grande Fome (ou Holodomor, que significa “morte pela fome”), colonos da Rússia foram trazidos para repovoar o campo.

Ucrânia: dividida entre a Rússia e o Ocidente

Essa história conturbada criou divisões duradouras. Como o leste da Ucrânia ficou sob o domínio russo muito mais cedo do que o oeste da Ucrânia, os habitantes do leste têm laços mais fortes com a Rússia e têm sido mais propensas a apoiar líderes russos.

A Ucrânia do Oeste, ao contrário, passou séculos sob constantes mudanças de controle por potências europeias como a Polônia e o Império Austro-Húngaro, uma das razões pelas quais os ucranianos no ocidente tendem a apoiar mais políticos ocidentais.

Em linhas gerais, a população oriental tende a falar a língua russa e praticar a religião ortodoxa, enquanto no ocidente se fala mais ucraniano e a população é mais católica.

Com o colapso da União Soviética em 1991, a Ucrânia tornou-se uma nação independente. Mas unir o país provou ser uma tarefa difícil. Por um lado, “o senso de nacionalismo ucraniano não é tão profundo no leste como é no oeste”, diz o ex-embaixador na Ucrânia Steven Pifer.

Fronteiras entre Ucrânia e Rússia.

A transição para a democracia e o capitalismo foi dolorosa e caótica, e muitos ucranianos, especialmente no leste, ansiavam pela relativa estabilidade das eras anteriores.

O mapa da Ucrânia e a sua curiosa relação com a Rússia

“Depois de todos esses fatores, a maior divisão é entre aqueles que veem os domínios imperial russo e soviético mais simpaticamente versus aqueles que os vêem como uma tragédia”, diz Adrian Karatnycky, especialista em Ucrânia e ex-membro do Conselho Atlântico dos Estados Unidos.

Essas fissuras foram expostas durante a Revolução Laranja, de 2004, na qual milhares de ucranianos marcharam para apoiar uma maior integração com a Europa.

Pedestres em Odessa, uma cidade portuária no Mar Negro, no sul da Ucrânia, passam junto de um cartaz soviético anunciando temas sobre poder e justiça em 1991, o ano em que a Ucrânia se tornou uma nação independente e a URSS foi dissolvida.

Nos mapas físicos, até é possível ver a divisão entre as estepes do sul e do leste da Ucrânia, com os seus férteis solos agrícolas, e as regiões de mais florestas do norte e do oeste, comenta Serhii Plokhii, professor de história em Harvard e diretor do Instituto de Pesquisa da Ucrânia desta universidade.

Segundo Plokhii, o mapa que retrata as demarcações entre a estepe e a floresta, uma linha diagonal entre leste e oeste, tem uma “semelhança impressionante” com os mapas políticos das eleições presidenciais ucranianas de 2004 e 2010.

Ucrânia e Rússia: perto de uma nova Guerra Fria?

A Crimeia foi ocupada e anexada pela Rússia em 2014, seguida pouco depois por uma revolta separatista na região oriental ucraniana de Donbass, que resultou na declaração das Repúblicas Populares de Lugansk e Donetsk, apoiadas e recentemente reconhecidas pela Rússia.

Hoje, o exército russo está novamente reunido nas fronteiras da Ucrânia e há movimento de tropas russas no Donbass, em um novo capítulo da história tumultuada da região.

Onde fica Donetsk e Lugansk

Donetsk é uma cidade localizada no leste da Ucrânia, acima do rio Kalmius. É considerada o centro industrial mais importante da região histórica de Donbass. A cidade se encontra em meio ao bioma de estepe ucraniano e é rodeada por bosques, colinas, lagos e rios que favorecem a atividade agrícola no entorno.

Já Lugansk, também ao leste da Ucrânia, está entre o cruzamento dos rios Luhan e Ol’khivka. Assim como Donetsk, é um importante centro industrial desta parte do país e uma das maiores cidades ao leste, próxima à divisa com a Rússia.

Onde fica Donbass

Tanto Donetsk como Lugansk são províncias pertencentes à região de Donbas ou Donbass, localizada no sudeste da Ucrânia, e que faz fronteira com a Rússia (ficando a menos de 800 quilômetros de Moscou). A região ocupa uma posição estratégica por ter acesso ao Mar Negro e, por consequência, dar escoamento para o Mar Mediterrâneo.

A chamada bacia de Donbass é a mais importante fonte de energia e a maior região industrial da Ucrânia; é um local conhecido por suas riquezas minerais, principalmente ligadas à produção de carvão e aço. Por isso, a área abriga um grande parque siderúrgico, químico e metalúrgico.

Compartilhe este post:

Facebook
Twitter
WhatsApp
Telegram
Facebook
WhatsApp
X
Threads

Artigos do mesmo Autor

Postar sem cessar? Como as redes sociais remodelam nossa vida de oração

Como as redes sociais remodelam nossa vida de oração

Postar sem cessar? Como as redes sociais remodelam nossa vida de oração

Milhares de pessoas oraram por Sarah Walton. A maioria delas Sarah nunca chegou a conhecer.

Nos últimos dez anos, Sarah Walton, a co-autora do best-seller Hope When It Hurts, sofreu com uma doença crônica, várias cirurgias para uma lesão debilitante no pé, estresse financeiro decorrente da perda do emprego do marido e uma mudança pelo país com quatro crianças que também têm problemas de saúde significativos e necessidades especiais.

Todos os dias, seus canais nas redes sociais recebem notificações de que seus amigos estão intercedendo por ela.

“Quando entro no Facebook ou no Instagram, vejo pessoas de todo o país dizendo que estão orando”, ela me disse. “Eles deixam emojis de mãozinhas orando. Eles enviam mensagens pelo direct com as coisas específicas pelas quais oraram naquela manhã”.

Os parceiros de oração de Sarah não são todos seus amigos no sentido tradicional da palavra — ela nunca compartilhou um café ou uma conversa cara a cara com muitos deles —, mas são cristãos que se importam o suficiente para pedir a cura dela a Deus.

Em uma era online — e especialmente durante uma pandemia que transferiu muitas das interações para as plataformas virtuais — a experiência de Sarah Walton não é algo estranho. A maioria de nós já viu pedidos para orar por alguém nas redes sociais, e muitos de nós já reservamos um momento para orar.

Interceder no Instagram pode parecer um fenômeno exclusivo do século 21, mas as pessoas já oravam à distância no primeiro século. Como suas cartas testificam, o apóstolo Paulo tinha por hábito orar por pessoas que não estavam com ele — e às vezes até por pessoas que nunca conheceu.

A mídia social é uma ferramenta imperfeita para a oração; suas interações superficiais e efêmeras não se prestam prontamente ao trabalho árduo da batalha espiritual. Mas o exemplo de oração de Paulo nos desafia de várias maneiras — ensinando-nos como é possível usar até mesmo o TikTok para o bem espiritual.

Proximidade

“Quem é meu próximo?”, pergunta que um intérprete da lei fez a Jesus (Lucas 10.29), é uma pergunta importante para a nossa época. Nas mídias sociais, atualizações de pessoas da nossa igreja local aparecem lado a lado com solicitações de amizade de pessoas que nunca conhecemos. Queremos genuinamente amar nosso próximo, mas os limites da proximidade online se estendem pelo mundo todo. E todos precisam de oração.

Rosaria Butterfield, autora de The Gospel Comes with a House Key, não está no Twitter, nem no Facebook ou no Instagram. Ela não posta em um canal do YouTube nem usa o aplicativo do Clubhouse. Em vez disso, ela se comprometeu a amar seus próximos — literalmente falando, seus vizinhos de porta e aqueles que moram na sua rua.

Rosaria usa exclusivamente uma plataforma de rede social baseada na vizinhança e chamada Nextdoor. “Eu dou uma olhada na Nextdoor pela manhã para ver como posso orar por meus vizinhos, mas também para saber como posso ajudá-los”, ela me disse. “Uma dose diária passeando com o cachorro de alguém, tirando o lixo de outra pessoa e abrindo espaço na mesa de casa para o filho de outra pessoa participar do homeschooling me faz bem à alma. Também é bom para toda essa coisa de amar a Deus e ao próximo”. Para Rosaria Butterfield, o trabalho de orar pelos outros fica melhor quando unido ao trabalho tangível de dar a essas pessoas uma mão amiga. E ela só consegue fazer isso quando prioriza a proximidade.

Paulo também valorizou os relacionamentos de oração enraizados em interações face a face. Em sua carta aos colossenses, Paulo elogia Epafras, o pastor de Colossos. Epafras lutava em oração pelas pessoas de sua congregação — pessoas que compartilhavam refeições e assumiam o ministério com ele —, e continuou a orar por elas quando estava fisicamente distante (Colossenses 4.12,13). Embora a mídia social nos dê inúmeras oportunidades de orar por quase qualquer pessoa, Paulo nos ensina a começar com as pessoas de nossa igreja ou que moram na mesma rua.

Mutualidade

As pessoas em nossas igrejas e comunidades locais também estão mais propensas a orar por nós. Os pedidos de oração publicados nas redes sociais costumam ser uma via de mão única — mas os relacionamentos de oração florescem melhor quando são mútuos. Todas as vezes que Paulo orava pelas igrejas, ele também pedia que orassem por ele (1Coríntios 1.4-9; 2Coríntios 1.11). Ele não mandava um emoji com mãozinhas unidas em oração apenas; ele convidava as igrejas para um relacionamento.

Há um ano, Alex e Maggie Halbert vêm levantando sustento para mudarem para o campo missionário em Honduras. Eles regularmente enviam e-mails com necessidades de oração e pedidos de ajuda financeira para igrejas dos Estados Unidos inteiro. Certo dia, porém, sua caixa de entrada trouxe uma surpresa. “Uma das igrejas que nos sustentam nos enviou pedidos de oração”, disse Alex. “Isso nos encorajou e nos deu um senso mais profundo do que significa sermos parceiros em prol do evangelho. Sentimos que poderíamos ser participantes, e não apenas destinatários”.

Invisibilidade

Recentemente, o Facebook vem testando um recurso de “postagem de oração” que permite que as pessoas compartilhem pedidos de oração e respondam a eles. Com um clique, os usuários podem notificar o autor da postagem — e o resto do mundo — de que estão orando pelo pedido.

Esses símbolos visíveis de oração podem ser encorajadores para um amigo necessitado, mas também criam perigo espiritual para a pessoa que está orando. O desafio, disse Rosaria Butterfield, é que “a maioria das plataformas de rede social privilegia a sinalização de virtude em detrimento da própria virtude”. O próprio Jesus nos lembra que a obra da oração é melhor realizada em secreto (Mateus 6.6), contexto em que ninguém pode ficar impressionado com a nossa piedade.

Obviamente, a atração das mídias sociais geralmente se baseia no que é visível. Para usuários de plataformas como Instagram e Facebook, a experiência gira em torno da capacidade de compartilhar imagens ou vídeos — permitir que amigos e seguidores vejam algo. A oração, em contraste, é uma ferramenta espiritual usada em locais secretos para fins espirituais. E esses fins geralmente são invisíveis.

Quando Paulo orava por outros cristãos, suas orações se concentravam em objetivos espirituais invisíveis. Ele orava para que eles tivessem sabedoria, conhecimento de Cristo, esperança, riquezas espirituais, confiança no poder de Deus e amor pela igreja (Efésios 1.17-23). Ninguém consegue postar fotos de nenhuma dessas coisas.

Embora certamente seja bom e correto orar por respostas tangíveis — por exemplo, por cura física (Tiago 5.13-18) e pelo pão nosso de cada dia (Mateus 6.11), coisas pelas quais recebemos ordem para orar —, não podemos permitir que a natureza visual das interações online limite nossas petições (ou alimente nosso orgulho). Só porque não há fotografia, não significa que o Senhor não esteja trabalhando.

Tenacidade

“A oração muda as coisas”, disse Sarah Walton, “mas a oração também muda as pessoas que oram”. Ela relata as maneiras pelas quais Deus mudou seu próprio coração ao longo de anos de provações. Embora ela orasse por atos específicos de cura, agora ela ora frequentemente para que Deus lhe mostre mais de si mesmo.

“Se as pessoas orassem por mim apenas uma ou duas vezes, não teriam a chance de ver como meu coração e minhas próprias orações amadureceram ao longo desta jornada”, disse ela. As pessoas que permanecem — seja na vida real, seja online — são as que podem ver o que Deus está fazendo na vida de Sarah. Uma das características mais marcantes das intercessões de Paulo era a sua tenacidade. Ele relatou às igrejas que orou por elas “noite e dia” (1Tessalonicenses 3.10), por um longo período de tempo. Cristo também encorajava seus seguidores a “orar sempre e nunca desistir” (Lucas 18.1). Em um mundo de stories online que desaparecem em um intervalo de 24 horas, o Senhor se delicia com a longevidade.

Na verdade, não é errado orar uma vez por alguém, mas assim talvez nunca vejamos qualquer resultado. As respostas às orações geralmente vêm depois de um longo período de tempo. As pessoas que conseguem ver o que Deus está fazendo são as que continuam por perto, orando e esperando misericórdias temporais e crescimento espiritual.

A rolagem sem fim do feed de notícias das redes sociais e sua gratificação instantânea podem não ser ideais para cultivar uma rica vida de oração, mas a situação não é desesperadora. O exemplo de Paulo — de proximidade, mutualidade, invisibilidade e tenacidade — pode moldar nossos hábitos de oração. Suas orações deliberadas, escritas à bico de pena, mudaram o mundo. Talvez, se seguirmos seu exemplo, nossas intercessões no Instagram façam o mesmo.

Megan Hill é editora da rede The Gospel Coalition e autora de vários livros, incluindo Praying Together e Partners in the Gospel.

Traduzido por Mariana Albuquerque.

Compartilhe este post:

Facebook
Twitter
WhatsApp
Telegram
Picture of Pregando pelo Mundo

Pregando pelo Mundo

Artigos do mesmo Autor

Deixai vir a mim os refugiados afegãos

Deixai vir a mim os refugiados afegãos

Como podemos ver pelas imagens angustiantes que vêm do Afeganistão, a maioria dos que desejam fugir do Talibã jamais conseguirá escapar, mesmo muitos daqueles que ajudaram fielmente os Estados Unidos na guerra de vinte anos naquele país.

Alguns, porém, conseguirão chegar a outros países — entre eles, os Estados Unidos — em busca de abrigo e de começar uma nova vida. Como cristãos evangélicos, devemos decidir, mesmo antes da chegada de nossos novos próximos, ignorar as vozes dos que nos pedem para temermos esses refugiados.

Ao longo da história, aqueles que desejam rejeitar os refugiados adotam uma série de táticas diferentes. Às vezes falam deles usando termos que remetem à “impureza” — usando roedores ou insetos como metáforas — ou podem sugerir que os que estão em busca de asilo são, eles próprios, vetores de doenças. Outras vezes, embora com menos frequência, referem-se, tão grosseiramente quanto alguns o são, aos refugiados como uma “invasão” daqueles que estão vindo para “tomar nosso lugar” (sendo que esse “nós” quase sempre se refere a americanos brancos e nominalmente cristãos). Mas, talvez com maior frequência, falem dos refugiados como uma ameaça.

Assim como vimos acontecer com os refugiados sírios e curdos em anos anteriores, em breve ouviremos o clamor insistente daqueles que argumentam que os refugiados afegãos são terroristas, ou pelo menos podem ser, já que “não passaram por um processo de verificação” e não sabemos nada sobre eles . Essas afirmações não são verdadeiras.

Como Elizabeth Neumann — uma ex-autoridade da área de segurança nacional do alto escalão do governo Trump — demonstra, mesmo que um terrorista se dispusesse a jogar um longo jogo de vinte anos, fingindo ser uma figura a favor do Ocidente e contrária aoTalibã, o processo de verificação para todos esses refugiados é intenso e rigoroso, e faz uso de extensas checagens biométricas e biográficas. E, como Neumann também aponta, o tipo de retórica usada contra esses refugiados quase sempre vem acompanhada por um aumento nos crimes ou na violência cometidos contra essas pessoas.

Os refugiados que se mudarem para sua comunidade não estarão lá para aterrorizar você nem para “tomar seu lugar”. Em vez disso, eles estarão procurando a chance de começar uma nova vida — sem ter que ver seus filhos sendo assassinados e suas filhas sendo estupradas por déspotas sedentos de sangue. Dessa forma, eles serão como inúmeras outras pessoas que encontraram refúgio nos Estados Unidos. Você pode ver muitos deles no desfile de Quatro de Julho em sua cidade; muitas vezes são eles que agitam as maiores bandeiras americanas e choram com uma alegria patriótica.

Alguns desses refugiados são seus irmãos e irmãs em Cristo. Outros serão seus futuros irmãos e irmãs em Cristo. Quer sejam quer não, porém, cada um deles reflete para nós a imagem de um Deus que fez a humanidade à sua imagem e ama a cada um de nós.

O medo dos refugiados tem como objetivo nos manter em um estado de alerta que vê tudo e todos que não sejam imediatamente familiares a nós como uma ameaça. Isso mantém telespectadores sintonizados em canais de televisão, pessoas ligando para programas de rádio, doadores enviando dólares para políticos e grupos de interesse. Esse tipo de anulação do sistema límbico pode fazer com que mesmo cristãos que conhecem sua Bíblia se esqueçam até dos mais singelos mandamentos que Jesus nos deu para amar e cuidar dos vulneráveis.

Como Martin Luther King Jr. escreveu, em 1963, o sacerdote e o levita da parábola de Jesus, que se desviaram do homem espancado ao lado da estrada para Jericó, provavelmente não se sentiam pessoas cruéis ou sem coração. Eles deviam estar com medo — e de forma compreensível. O caminho para Jericó era um local afastado e perigoso, propício para criminosos violentos. Aqueles que passaram apressados [pelo homem espancado] podiam muito bem presumir que seriam atacados na próxima curva.

“Talvez os ladrões ainda estivessem por perto”, escreveu King. “Ou talvez o homem ferido no chão fosse um impostor, que desejava atrair para si os viajantes que por ali passavam para atacá-los de forma rápida e fácil. Imagino que a primeira pergunta que o sacerdote e o levita tenham feito foi: ‘Se eu parar para ajudar este homem, o que acontecerá comigo?’ ”

Há ocasiões em que somos chamados a um amor genuinamente perigoso por nosso próximo. Vemos isso no cuidado do samaritano com o homem ferido na estrada para Jericó — ou na igreja primitiva, que superou seu medo de que o terrorista perseguidor da igreja, chamado Saulo de Tarso, pudesse estar fingindo ser um discípulo para fazer mal a eles como alguém de dentro da igreja (Atos 9.26).

No caso dos refugiados afegãos, não enfrentamos nada que se aproxime desse nível de perigo para nós mesmos.

O medo às vezes pode calar até mesmo nossas convicções mais profundas. Começamos a agir de maneiras que visam a autoproteção e nos fazem atacar indiscriminadamente até mesmo ameaças imaginárias. A Bíblia, porém, diz que o amor perfeito lança fora o medo (1João 4.18). Isso deve nos fazer lembrar que, quando nos pegamos perguntando “Quem é meu próximo?”, estamos fazendo a pergunta errada.

Russell Moore lidera o Public Theology Project [Projeto de Teologia Pública] da Christianity Today.

Traduzido por Mariana Albuquerque

Compartilhe este post:

Facebook
Twitter
WhatsApp
Telegram
Picture of Pregando pelo Mundo

Pregando pelo Mundo

Artigos do mesmo Autor

Os 50 países mais difíceis de ser cristão em 2021

Picture of Pregando pelo Mundo

Pregando pelo Mundo

Os 50 países mais difíceis de ser cristão em 2021

O Sudão finalmente saiu dessa lista dos 10 piores países em termos de perseguição, na qual a Índia permanece, enquanto Moçambique e República Democrática do Congo somam-se à Lista Mundial da Perseguição 2021, elaborada pela missão Portas Abertas.

Todos os dias, 13 cristãos no mundo todo são mortos por causa de sua fé. Todos os dias, 12 templos ou edifícios cristãos são atacados. E todos os dias, 12 cristãos são injustamente detidos ou presos, e outros 5 são sequestrados.

É o que relata a Lista Mundial da Perseguição 2021, o último relatório anual da missão Portas Abertas sobre os 50 principais países em que os cristãos são mais perseguidos por seguir a Jesus.

“Você pode pensar que a lista é toda sobre opressão. … Mas a lista tem tudo a ver com resiliência”, afirmou David Curry, presidente e CEO da Portas Abertas USA, ao apresentar o relatório divulgado hoje.

“O número de pessoas do povo de Deus que está sofrendo deveria significar que a Igreja está morrendo — que os cristãos estão se calando, perdendo a fé e se afastando uns dos outros”, afirmou.

“Mas não é isso que está acontecendo.

Em vez disso, em cores nítidas, vemos as palavras de Deus registradas no profeta Isaías: ‘Abrirei um caminho no deserto e rios no deserto.’ (Isaías 43.19, ESV)”.

As nações listadas somam 309 milhões de cristãos que vivem em lugares com níveis de perseguição muito altos ou extremos, acima dos 260 milhões da lista do ano passado.

A esses países poderiam ser acrescentados outros 31 milhões de cristãos dos 24 países que vêm logo após os 50 primeiros — como Cuba, Sri Lanka e os Emirados Árabes Unidos — [contribuindo] para a proporção de 1 em cada 8 cristãos em todo o mundo que enfrentam perseguição.

Isso inclui 1 em cada 6 cristãos na África e 2 em cada 5 na Ásia.

No ano passado, 45 países tiveram uma classificação suficientemente alta para pontuar níveis de perseguição “muito altos” na matriz de 84 questões da missão Portas Abertas.

Este ano, pela primeira vez em 29 anos de acompanhamento, todos os 50 países atingiram essa pontuação — assim como o fizeram mais 4 outras nações, que por pouco ficaram de fora dessa lista das 50 primeiras.

A missão Portas abertas identificou três tendências principais que impulsionaram o aumento do ano passado:

  • “A COVID-19 agiu como um catalisador para a perseguição religiosa por meio de discriminação, conversão forçada e como justificativa para aumentar a vigilância e a censura.”
  • “Ataques extremistas se espalharam oportunisticamente por toda a África Subsaariana, da Nigéria e Camarões a Burkina Faso, Mali e além.”
  • “Os sistemas de censura chineses continuam a se propagar e se espalhar para estados emergentes de vigilância”.

A Portas Abertas têm monitorado a perseguição aos cristãos em todo o mundo desde 1992. A Coreia do Norte ocupa o primeiro lugar há quase 20 anos, desde 2002, quando a lista mundial da perseguição começou a ser feita.

A lista de 2021 rastreia o período de 1º de novembro de 2019 a 31 de outubro de 2020, e foi compilada a partir de relatórios de campo de funcionários da missão Portas Abertas em mais de 60 países.

“Não estamos conversando apenas com líderes religiosos”, disse Curry, no lançamento da lista deste ano, transmitido ao vivo via streaming. “Estamos ouvindo em primeira mão aqueles que estão sendo perseguidos, e registrando apenas o que podemos documentar.”

O objetivo desses rankings anuais da Lista Mundial da Perseguição — que relatam como a Coreia do Norte agora enfrenta concorrência, à medida que a perseguição fica cada vez pior — é servir de orientação para orações e buscar uma forma de ira mais eficaz, ao mesmo tempo em que mostra aos cristãos perseguidos que eles não foram esquecidos.

Onde os cristãos são mais perseguidos hoje?

Este ano, os 10 países que figuram como os piores perseguidores de cristãos permaneceram relativamente inalterados.

Depois da Coreia do Norte vem o Afeganistão, seguido pela Somália, Líbia, Paquistão, Eritreia, Iêmen, Irã, Nigéria e Índia.

A Nigéria entrou nessa lista dos 10 países que figuram como os piores perseguidores de cristãos pela primeira vez, após atingir o nível mais alto na métrica da missão Portas Abertas para violência.

A nação, que tem a maior população cristã da África, ocupa a 9ª posição geral no ranking, mas no quesito violência está na 2ª posição, ficando atrás apenas do Paquistão, e ocupa a 1ª posição no quesito número de cristãos mortos por razões relacionadas à sua fé.

O Sudão saiu desse grupo dos 10 piores países pela primeira vez em seis anos, após abolir a pena de morte por apostasia e garantir — ao menos no papel — liberdade religiosa em sua nova constituição, após três décadas de vigor da lei islâmica.

(Esta mudança, ocorrida em dezembro entre os 10 países que figuram como os piores perseguidores de cristãos, repercute a decisão do Departamento de Estado dos EUA de adicionar a Nigéria e remover o Sudão de sua lista de países de preocupação particular, a qual aponta e envergonha governos que “se envolveram ou toleraram violações sistemáticas, contínuas e flagrantes da liberdade religiosa.”)

A Índia permanece entre os 10 piores países pelo terceiro ano consecutivo, pois “continua a ver um aumento na violência contra as minorias religiosas devido ao extremismo hindu sancionado pelo governo”.

Enquanto isso, a China se juntou ao grupo dos 20 piores países perseguidores pela primeira vez em uma década, devido à “vigilância e censura contínuas e crescentes de cristãos e de outras minorias religiosas”.

Dos 50 países que figuram como os piores perseguidores de cristãos:

  • 12 têm níveis “extremos” de perseguição e 38 têm níveis “muito altos”. Outras 4 nações, além das 50 primeiras, também se enquadraram como tendo níveis de perseguição “muito altos”: Cuba, Sri Lanka, Emirados Árabes Unidos e Níger.
  • 19 estão na África (sendo 6 deles no Norte da África); 14 estão na Ásia; 10 estão no Oriente Médio; 5 estão na Ásia Central e 2 estão na América Latina.
  • 34 têm o islamismo como religião principal; 4 têm o budismo; 2 têm o hinduísmo; 1 segue o ateísmo; 1 segue o agnosticismo — e 10 têm como religião principal o cristianismo.

A lista de 2021 acrescentou quatro novos países: México (37º lugar), República Democrática do Congo (40º lugar), Moçambique (45º lugar), e Comores (50º lugar).

Moçambique subiu 21 posições (deixando o 66º lugar) “devido à violência extremista islâmica na província do norte de Cabo Delgado.”

A República Democrática do Congo subiu 17 posições (deixando o 57º lugar) “principalmente devido a ataques a cristãos pelo grupo islâmico Forças Democráticas Aliadas (ADF).”

O México subiu 15 pontos (deixando o 52º lugar) devido ao aumento da violência e da discriminação contra cristãos por parte de traficantes de drogas, gangues e comunidades indígenas.

Quatro países saíram da lista: Sri Lanka (anteriormente no 30º lugar), Rússia (anteriormente no 46º lugar), Emirados Árabes Unidos (anteriormente no 47º lugar) e Níger (anteriormente no 50º lugar).

Outras grandes mudanças na classificação: a Colômbia subiu 11 posições, passando do 41º para o 30º lugar, devido à violência de guerrilheiros, grupos criminosos e comunidades indígenas, bem como pela crescente intolerância secular.

A Turquia subiu 11 posições, passando do 36º para o 25º lugar, devido a um aumento da violência contra cristãos.

E Bangladesh subiu sete posições, passando do 38º para o 31º lugar, devido a ataques a convertidos cristãos entre seus refugiados Rohingya.

No entanto, outros tipos de perseguição podem superar a violência [conforme explicado abaixo].

Por exemplo, a República Centro-Africana caiu 10 posições, passando do 25º para o 35º lugar, embora a violência contra os cristãos continue extrema.

E o Quênia caiu 6 posições, passando do 43º para o 49º lugar, embora os ataques lá “tenham aumentado significativamente”.

Enquanto isso, o Sudão do Sul está entre os 10 países mais violentos, segundo acompanhamento da missão Portas Abertas (ocupando o 9º lugar), mas, ainda assim, não está entre os 50 piores países da Lista Mundial da Perseguição (pois ocupa o 69º lugar).

No 25º aniversário da lista, em 2017, a missão Portas Abertas divulgou uma análise das tendências de perseguição ao longo dos últimos 25 anos.

As 10 principais nações, nesse período de 25 anos, foram: Coreia do Norte, Arábia Saudita, Irã, Somália, Afeganistão, Maldivas, Iêmen, Sudão, Vietnã e China.

Cinco países aparecem na lista dos 25 anos e na lista dos 10 piores países de 2021 — um sinal preocupante da estabilidade da perseguição, como observou a missão Portas Abertas.

Como os cristãos são perseguidos nesses países?

A missão Portas Abertas rastreia a perseguição sob seis categorias — incluindo pressão social e governamental sobre indivíduos, famílias e congregações — e tem um foco especial nas mulheres.

Mas quando se isola a violência como uma categoria, os dez principais países perseguidores mudam dramaticamente — apenas Paquistão, Nigéria e Índia permanecem. Na verdade, hoje, há 20 países em que morrem mais cristãos do que na Coreia do Norte.

Os martírios registrados em todo o mundo aumentaram para 4.761 no relatório de 2021, 60% a mais do que os 2.983 registrados no ano anterior, e superando as 4.305 mortes observadas no relatório de 2019. (A Portas Abertas é conhecida por favorecer uma estimativa mais conservadora do que outros grupos, que geralmente contabilizam 100 mil martírios por ano.)

Nove em cada 10 cristãos mortos por causa de sua fé estavam na África, e o restante, na Ásia. A Nigéria assumiu o primeiro lugar no mundo, com 3.530 mártires confirmados pela missão Portas Abertas, em sua lista de 2021.

O rapto de cristãos subiu para 1.710, um aumento de 63 por cento ante os 1.052 registrados no ano anterior, a primeira vez que essa categoria foi rastreada por Portas Abertas. A Nigéria lidera a lista, com 990 raptos.

O Paquistão ficou com o primeiro lugar no mundo em número de casamentos forçados, uma nova categoria rastreada no ano passado, sendo que cerca de 1 mil cristãos casaram-se contra sua vontade com não-cristãos. A Ásia respondeu por 72 por cento dos casamentos forçados registrados pela Portas Abertas, e a África — liderada pela Nigéria —, pelos 28 por cento restantes.

A China é o principal violador nas outras duas categorias, previamente já monitoradas por Portas Abertas.

A China prendeu, encarcerou ou deteve sem julgamento 1.147 cristãos por motivos relacionados à fé, de um total de 4.277 em todo o mundo. Essa estimativa, feita pela missão Portas Abertas, ultrapassou os 3.711 do ano passado e os 3.150 em 2019.

Enquanto isso, ataques e fechamento forçado de igrejas totalizaram 4.488 em todo o mundo, tendo sido a grande maioria registrada na China, seguida pela Nigéria. No relatório do ano passado, a estimativa disparou de 1.847 para 9.488, sendo que a China respondeu sozinha por 5.576.

A missão Portas Abertas advertiu que, em vários países, as violações acima são muito difíceis de serem documentadas com precisão. Nestes casos, são apresentados números aproximados, mas sempre tendendo para estimativas conservadoras.

Sua pesquisa é certificada e auditada pelo Instituto Internacional pela Liberdade Religiosa, uma rede apoiada pela Aliança Evangélica Mundial, com sede na Alemanha.

Por que os cristãos são perseguidos nesses países?

A motivação principal varia de acordo com o país, e entender melhor essas diferenças pode ajudar cristãos de outros países a orarem e defenderem com mais eficácia seus irmãos e irmãs em Cristo que são vítimas de perseguição.

Por exemplo, embora o Afeganistão seja o segundo pior perseguidor do mundo e uma nação oficialmente muçulmana, o principal motivo de perseguição lá — de acordo com a pesquisa da Portas Abertas — não é o extremismo islâmico, mas o antagonismo étnico, ou o que o relatório chama de “opressão do clã”.

Portas abertas categoriza as fontes primárias de perseguição a cristãos em oito grupos:

Opressão islâmica (29 países): Esta é a principal fonte de perseguição que os cristãos enfrentam em mais da metade dos países monitorados, incluindo 5 dos 12 onde os cristãos enfrentam níveis “extremos” de perseguição: Líbia (Nº 4), Paquistão (Nº 5), Iêmen (Nº 7), Irã (Nº 8), e Síria (Nº 12). A maioria dos 30 são nações oficialmente muçulmanas ou de maioria muçulmana; no entanto, 7 delas na verdade são de maioria cristã: Nigéria (Nº 9), República Centro-Africana (Nº 35), Etiópia (Nº 36), República Democrática do Congo (Nº 40), Camarões (Nº 42), Moçambique (Nº 45) e Quênia (Nº 49).

Opressão do clã (6 países): Esta é a principal fonte de perseguição que os cristãos enfrentam em países como Afeganistão (Nº 2), Somália (Nº 3), Laos (Nº 22), Catar (Nº 29), Nepal (Nº 34), e Omã (Nº 44).

Paranoia ditatorial (5 países): Esta é a principal fonte de perseguição que os cristãos enfrentam em cinco países, principalmente nos da Ásia Central e de maioria muçulmana: Uzbequistão (Nº 21), Turcomenistão (Nº 23), Tajiquistão (Nº 33), Brunei (Nº 39), e Cazaquistão (Nº 41).

Nacionalismo religioso (3 países): Esta é a principal fonte de perseguição que os cristãos enfrentam em três nações asiáticas. Os cristãos são principalmente visados por nacionalistas hindus na Índia (Nº 10), e por nacionalistas budistas em Mianmar (Nº 18) e Butão (Nº 43).

Opressão comunista e pós-comunista (3 países): Esta é a principal fonte de perseguição que os cristãos enfrentam em três países, todos na Ásia: Coreia do Norte (Nº 1), China (Nº 17) e Vietnã (Nº 19).

Protecionismo denominacional cristão (2 países): Esta é a principal fonte de perseguição que os cristãos enfrentam na Eritreia (Nº 6) e Etiópia (Nº 36).

Corrupção e crime organizado (2 país): Esta é a principal fonte de perseguição que os cristãos enfrentam no Colômbia (Nº 30) e México (Nº 37).

Intolerância secular (0 países): A Portas Abertas rastreia essa fonte de perseguição enfrentada pelos cristãos, mas ela não é a principal fonte em nenhum dos 50 países estudados.

Quais são as principais tendências na perseguição a cristãos?

Portas Abertas identificou quatro tendências, novas ou contínuas, relativas a por que e como os cristãos foram perseguidos por sua fé no ano que passou.

Em primeiro lugar, a pandemia propiciou uma nova via para a perseguição, uma vez que a missão Portas Abertas documentou discriminação contra cristãos que recebiam ajuda por causa da COVID-19 em países como Etiópia, Malásia, Nigéria, Vietnã e Oriente Médio.

Na Índia, onde mais de 100 mil cristãos receberam ajuda de parceiros da missão Portas Abertas, 80 por cento destes relataram ter sido anteriormente “mandados embora de pontos de distribuição de alimentos. Alguns caminharam quilômetros e esconderam sua identidade cristã para conseguir comida em outros locais”, observaram os pesquisadores. A missão Portas Abertas também coletou relatos de “Cristãos que vivem em áreas rurais, a quem foi negado socorro”, em locais como Mianmar, Nepal, Vietnã, Bangladesh, Paquistão, Ásia Central, Malásia, Norte da África, Iêmen e Sudão. “Às vezes, essa negativa de ajuda partiu de oficiais do governo, mas, com mais frequência, partiu de chefes de aldeia, comitês ou outros líderes locais.”

Portas abertas observou:

“A pandemia global tornou a perseguição mais óbvia do que nunca — simplesmente porque muitas pessoas precisaram de ajuda. A clara discriminação e opressão sofrida por cristãos em 2020 não deve ser esquecida, mesmo depois que a crise da COVID-19 desaparecer de nossa memória coletiva.”

Os lockdowns nos serviços de saúde pública também aumentaram a vulnerabilidade de muitos crentes. “Os cristãos que abandonam a fé da maioria para seguir a Cristo sabem que correm o risco de perder todo o apoio do cônjuge, das famílias, das tribos e comunidades, bem como das autoridades locais e nacionais”, observaram os pesquisadores. “Se eles perderem renda, por causa da COVID-19, não podem recorrer às redes de apoio habituais para sobreviver.” Enquanto isso, líderes religiosos, do Egito à América Latina, disseram à missão Portas Abertas que a proibição dos cultos religiosos fez com que as doações caíssem em cerca de 40 por cento, reduzindo sua renda pessoal e a capacidade de suas congregações de oferecer assistência à comunidade em geral.

Portas abertas observou que:

“A maior parte dos que se converteram, vindos de religiões majoritárias, disseram que o confinamento devido à quarentena da COVID-19 os fez ficarem em isolamento social com aqueles que são mais antagônicos à sua fé em Jesus. Isso afetou especialmente mulheres e crianças pertencentes às minorias. Para milhões de cristãos, o trabalho, a educação e outros interesses externos proporcionam breves períodos de tranquilidade em face da constante perseguição. Então, quando os lockdowns ocorreram, isso significou que essa trégua não estaria mais disponível.”

“Também recebemos relatos de que o sequestro, a conversão forçada e o casamento forçado de mulheres e meninas aumentaram durante a pandemia, devido ao aumento da vulnerabilidade. Além disso, na América Latina, locais vulneráveis às gangues de drogas tornaram-se ainda mais perigosos para os cristãos, uma vez que a pandemia diminuiu a presença de autoridades que tentam manter a ordem”.

Em segundo lugar, o aumento da vigilância digital e por vídeo de grupos religiosos, bem como as melhorias e a proliferação das tecnologias de vigilância foram outra tendência importante.

“A China afirma que se moveu assertivamente para conter a COVID-19 depois que o vírus proliferou em Wuhan”, observaram os pesquisadores da missão Portas Abertas. “Mas, para seus 97 milhões de cristãos, o custo de pesadas restrições — como a vigilância que alcançou suas casas, o rastreamento das interações online e offline e o fato de terem seus rostos digitalizados em banco de dados de segurança pública — é alto.”

De acordo com o relatório:

“Relatórios de condados nas províncias de Henan e Jiangxi dizem que câmeras com software de reconhecimento facial estão agora em todos os locais religiosos aprovados pelo Estado. Muitas dessas câmeras foram instaladas próximas a câmeras de segurança padrão, mas elas se conectam ao Departamento de Segurança Pública, o que significa que a inteligência artificial pode se conectar instantaneamente a outros bancos de dados do governo. O software de reconhecimento facial está vinculado ao ‘Sistema de Crédito Social’ na China, que monitora a lealdade dos cidadãos em relação aos princípios do comunismo.”

Da mesma forma, na Índia, os pesquisadores da Portas Abertas observaram que “as minorias religiosas temem que os aplicativos de rastreamento de contato tenham ‘função creeping’ e sejam usados para ficar de olho neles e em suas movimentações”.

Terceiro, a tendência de “cidadania ligada à fé” continuou a se espalhar. “Em países como Índia e Turquia, a identidade religiosa está cada vez mais ligada à identidade nacional — ou seja, para ser um ‘verdadeiro’ indiano ou um bom turco, você deve ser hindu ou muçulmano, respectivamente”, observaram os pesquisadores. “Isso é muitas vezes implicitamente — senão explicitamente — incentivado pelo governo.”

Portas abertas observou:

“Em meio a uma onda de nacionalismo hindu, os cristãos indianos são constantemente pressionados por uma propaganda estridente. A mensagem “para ser indiano, você deve ser hindu” significa que multidões continuam a atacar e a perseguir cristãos, bem como muçulmanos. A crença de que cristãos não são verdadeiramente indianos significa discriminação generalizada, e muitas vezes a perseguição é conduzida com impunidade. A Índia também continua a bloquear o fluxo de fundos estrangeiros para muitos hospitais, escolas e organizações religiosas administradas por cristãos, tudo sob o pretexto de proteger a identidade nacional.”

“Na Turquia, o governo também assumiu o papel de protetor nacionalista do Islã. A Hagia Sophia foi originalmente uma catedral e depois uma mesquita, até que a Turquia secular decidiu que deveria ser um museu. Mas, em julho de 2020, o presidente turco convenceu um tribunal a transformá-la novamente em mesquita, fortalecendo o nacionalismo turco. … A influência turca e os objetivos nacionalistas se espalham além de suas fronteiras, principalmente em seu apoio ao Azerbaijão no conflito com a Armênia.”

Quarto, os ataques, em sua maioria promovidos por extremistas muçulmanos, aumentaram apesar dos lockdowns para conter o coronavírus. “Em grande parte do mundo, a violência contra cristãos realmente diminuiu durante a pandemia da COVID-19”, observaram os pesquisadores, mas os cristãos na África subsaariana “enfrentaram níveis de violência até 30 por cento mais altos do que no ano passado.”

Portas abertas observou que:

“Várias centenas de aldeias, sobretudo cristãs, na Nigéria foram ocupadas ou saqueadas por pastores militantes muçulmanos Hausa-Fulani armados; em alguns casos, campos e plantações também foram destruídos.” Boko Haram — e seu grupo dissidente, o Estado Islâmico da África Ocidental (ISWAP, da sigla em inglês), um afiliado do EI — continuam a atormentar a Nigéria e o extremo norte de Camarões.”

“Na região do Sahel, imediatamente ao sul do Deserto do Saara, o extremismo islâmico é alimentado pela injustiça e pela pobreza. Esses grupos extremistas exploram falhas de governos frágeis, e jihadistas armados espalham propaganda, incentivam o recrutamento e conduzem ataques regulares. Este ano, alguns grupos se comprometeram a travar guerra contra ‘infiéis’ como os cristãos — eles afirmam que ‘Alá pune a todos’ com a pandemia por causa dos infiéis”.

“Em Burkina Faso, país até recentemente conhecido pela harmonia inter-religiosa entre muçulmanos e cristãos, 1 milhão de pessoas — 1 em cada 20 da população — foram deslocadas (e milhões mais passam fome) como resultado da seca, bem como da violência. No ano passado, Burkina Faso entrou dramaticamente na [LMP] pela primeira vez. Este ano, extremistas islâmicos continuam a visar igrejas (14 mortos em um ataque, 24 em outro).”

Como a LMP se compara a outros relatórios importantes sobre a perseguição religiosa?

A missão Portas Abertas acredita que é razoável chamar o cristianismo de religião mais severamente perseguida do mundo. Ao mesmo tempo, destaca que não há uma documentação comparável para a população muçulmana mundial.

Outras avaliações da liberdade religiosa em todo o mundo corroboram muitas das descobertas da Portas Abertas. Por exemplo, a última análise do Pew Research Center sobre as hostilidades governamentais e sociais contra a religião revelou que os cristãos foram perseguidos em 145 países em 2018, mais do que qualquer outro grupo religioso. Muçulmanos foram perseguidos em 139 países, seguidos por judeus em 88 países.

Quando se examina apenas a hostilidade por parte dos governos, os muçulmanos foram perseguidos em 126 países e os cristãos em 124 países, de acordo com o Pew Research Center. Quando se examina apenas a hostilidade dentro da sociedade, os cristãos foram perseguidos em 104 países e muçulmanos em 103 países.

Todas as nações do mundo são monitoradas por pesquisadores e equipe de campo da missão Portas Abertas, mas eles dão atenção mais profunda a 100 nações e foco especial nas 74 que registram níveis “altos” de perseguição (com pontuações acima de 40 em uma escala de 100 pontos, utilizada pela missão Portas Abertas).

Falando durante o evento de lançamento, Sam Brownback, embaixador-geral dos Estados Unidos para a liberdade religiosa internacional, elogiou a Lista Mundial da Perseguição. “Chegará o dia em que as pessoas poderão praticar sua fé livremente, e os governos protegerão esse direito”, disse ele. “Este dia está se aproximando e a missão Portas Abertas ajuda nesse esforço.”

Fonte: Christianity Today

Compartilhe este post:

Facebook
Twitter
WhatsApp
Telegram

Artigos do mesmo Autor

Países da ex-Iugoslávia são favoráveis a sociedade multicultural

Croácia, Ex-Iugoslávia

Países da ex-Iugoslávia são favoráveis a sociedade multicultural

A ex-Iugoslávia passou grande parte da década de 1990 em turbulência, com uma série de guerras ocorrendo em meio à divisão do país em seus estados atuais – cada um dos quais com uma composição étnica e religiosa distinta.

Mas uma nova pesquisa do Pew Research Center conduzida nas três maiores ex-repúblicas iugoslavas descobriu que, em geral, a maioria das pessoas na Bósnia, Croácia e Sérvia parecem dispostas a compartilhar suas sociedades com grupos étnicos e religiosos diferentes dos seus – uma grande mudança em relação às situações durante as guerras iugoslavas. Ao mesmo tempo, alguns sinais latentes de tensão e desconfiança persistem.

A pesquisa, conduzida como parte de um estudo mais amplo da religião na Europa Central e Oriental, descobriu que a Bósnia, o menor dos três países em população e tamanho, é também o que apresenta maior diversidade religiosa, com cerca de metade dos adultos se identificando como muçulmanos e cerca de um terço como cristão ortodoxo. A Croácia e a Sérvia têm, cada uma, uma única religião dominante: mais de oito em cada dez adultos se identificam como católicos e ortodoxos, respectivamente.

Embora as afiliações religiosas diferem de país para país, a grande maioria dos três países diz que uma sociedade multicultural é melhor do que outra religiosa e etnicamente homogênea. Quase três quartos dos adultos na Bósnia (73%) e cerca de dois terços na Sérvia (66%) e na Croácia (65%) concordam que “é melhor para nós se a sociedade for formada por pessoas de diferentes nacionalidades, religiões e culturas.” Dos 18 países pesquisados ​​na região, esses são os três onde essa visão é mais difundida; em vários outros países, a opinião que prevalece é que é melhor para a sociedade se houver menos diversidade religiosa e étnica.

A pesquisa também perguntou sobre os sentimentos em relação a grupos religiosos específicos, encontrando ampla aceitação dos cristãos ortodoxos, católicos e muçulmanos como concidadãos e vizinhos nos três países. Os entrevistados foram questionados se estariam dispostos a aceitar pessoas que não eram de sua própria fé em algumas circunstâncias diferentes e, em cada país, pelo menos três quartos disseram que aceitariam membros de outras religiões como vizinhos. Participações ainda maiores estariam dispostas a aceitá-los como concidadãos. Por exemplo, 75% dos não-muçulmanos na Sérvia dizem que aceitariam os muçulmanos como vizinhos, enquanto 82% dizem que os aceitariam como cidadãos de seu país.

Mas há limites para essa aceitação: as pessoas nos três países mostram significativamente menos disposição para aceitar seguidores de outras religiões como membros da família. Isso é mais pronunciado na Bósnia, apesar do fato de ter a população com maior diversidade religiosa e a maior porcentagem a favor de uma sociedade multicultural.

Apenas cerca de quatro em cada dez bósnios não muçulmanos dizem que aceitariam muçulmanos em suas famílias, semelhante à participação de bósnios não ortodoxos ou católicos que dizem o mesmo sobre os membros desses grupos. Da mesma forma, na Sérvia, apenas 43% dos não-muçulmanos dizem que receberiam bem os muçulmanos que se juntassem à família.

Por outro lado, na Croácia de maioria católica e na Sérvia de maioria ortodoxa, mesmo aqueles que não fazem parte da religião majoritária (incluindo muitos que não são religiosamente afiliados) estão esmagadoramente dispostos a aceitar aqueles que se identificam com a fé da maioria como membros da família .

Em todos os três países, os adultos com menos do que o ensino médio são, em muitos casos, significativamente menos propensos do que os adultos com ensino superior a aceitar pessoas de outros grupos religiosos como membros da família. Não há diferenças significativas entre homens e mulheres ou entre grupos de idade sobre essas questões, mas há uma divisão religiosa: no balanço, aqueles que consideram a religião “muito importante” em suas vidas têm menos probabilidade de aceitar membros de outras religiões suas famílias.

Essa reticência não é o único sinal de tensão na região. Na verdade, mais de oito em cada dez adultos em todos os três países dizem, em resposta a uma pergunta geral sobre a confiança social, que “você não pode ser muito cuidadoso ao lidar com as pessoas” – uma das maiores participações que expressam essa opinião na região mais ampla da Europa Central e Oriental. A confiança pública é menor na Bósnia, onde apenas 6% dizem que “a maioria das pessoas é confiável”.

Além disso, ainda há sinais de nacionalismo robusto em alguns desses países. A maioria dos sérvios (59%) diz que é muito importante ser cristão ortodoxo para ser “verdadeiramente sérvio”. E a maioria dos bósnios (68%) e sérvios (65%) concorda com a afirmação: “Nosso povo não é perfeito, mas nossa cultura é superior às outras”.

Fonte: Pew Research 

Compartilhe este post:

Facebook
Twitter
WhatsApp
Telegram
Picture of Pregando pelo Mundo

Pregando pelo Mundo

Por que as igrejas do Quênia estão banindo os políticos dos púlpitos?

Por que as igrejas do Quênia estão banindo os políticos dos púlpitos?

Os frequentadores da igreja no Quênia estão acostumados com políticos bem vestidos entrando em carros para comparecer aos cultos aos domingos – geralmente com câmeras.

Eles costumam chegar cheios de doações em dinheiro – carregadas por seus manipuladores em bolsas de ombro – que podem ser usadas para a construção de mega igrejas e a compra de sistemas de música. Em troca dessa dádiva, no meio do culto, o político sobe ao púlpito, onde a congregação se torna uma audiência cativa para sua mensagem, que muitas vezes tem pouco a ver com a Bíblia.

Esses “sermões” frequentemente chegam aos boletins de TV para satisfazer um apetite insaciável por notícias sobre aqueles que estão se mobilizando antes da próxima eleição, ainda daqui a nove meses.

Alguns fazem turnês em busca de novas congregações, levando a alguns confrontos dentro das igrejas com políticos acusando uns aos outros de invadir o gramado uns dos outros. Os Padres também são conhecidos por serem convidados às casas de políticos para discutir “questões de desenvolvimento” – como parte das negociações para amenizar essas guerras territoriais.

Há alegações – negadas, é claro – de que algumas das doações são produto de ganhos ilícitos. Agora os líderes das igrejas estabelecidas estão fartos. Eles baniram os políticos do púlpito, acusando-os de fazer comentários “facciosos e não edificantes” que “profanam a igreja”.

Para diminuir a atenção da mídia, as igrejas também deixarão de divulgar os valores doados por políticos para projetos eclesiásticos. “Em parte os padres são os culpados pela captura da Igreja por políticos. Era necessário devolver a prática à sua pureza”, explicou o arcebispo católico Anthony Muheria à BBC.

O chefe da Igreja Anglicana no Quênia, o arcebispo Jackson Ole Sapit, concordou que foi um “erro” dar margem de manobra aos políticos nas igrejas em primeiro lugar. “Eu tenho 100%. Mas não podemos permanecer no mesmo erro por muito tempo. Um momento de arrependimento – uma reviravolta – é necessário”, disse ele quando a proibição foi anunciada no mês passado.

 

‘Políticos são pessoas egoístas’

A mudança foi bem recebida por alguns – especialmente por esses fiéis com quem conversei na capital, Nairóbi. “Para ser honesta, foi uma distração. Tenho esperado os líderes da igreja para lidar com isso”, disse Eunice Waweru.

Janet Nzilani concordou: “Estou feliz que a decisão tenha sido tomada porque os políticos são pessoas egoístas. Eles não estão lá para inspirar as pessoas ou para pedir unidade. Eles não valorizam as pessoas de forma alguma. Os pastores devem apenas reconhecer sua presença [na igreja ] e nada mais.” Florence Atieno disse que os políticos deveriam ser tratados com respeito, reconhecidos por um pastor se estivessem na congregação e ter permissão para cumprimentar os membros após um culto. “Meu único problema é quando eles começam a fazer campanha e abusam uns dos outros na igreja”, disse ela.

Mas todas essas mulheres frequentam igrejas evangélicas cujos clérigos podem não concordar necessariamente com a proibição do púlpito. Ele está sendo liderado por igrejas anglicanas, católicas e presbiterianas e está enfrentando resistência daqueles ministérios onde a lealdade aos profetas autoproclamados e curandeiros pela fé é enorme.

 

Grande negócio

Os quenianos são predominantemente cristãos – 85,5% dos 50 milhões de habitantes do país, de acordo com o censo de 2019 – com a maioria agora indo para igrejas evangélicas. A Igreja Católica é a segunda denominação mais popular.

A economia da fé é um grande negócio – e uma arrecadação de fundos com o político certo pode melhorar muito a sorte de uma igreja. Muitas igrejas ficaram sem dinheiro como resultado da pandemia Covid-19, então não é surpresa que alguns clérigos evangélicos se opuseram a uma proibição geral do púlpito. “Não acho que vai criar raízes porque temos igrejas que são oportunistas, elas estão procurando políticos que lhes dêem dinheiro, às vezes até mesmo os convidam”, disse o comentarista de mídia Barrack Muluka à BBC.

O autor e estudioso Peter Kimani explica que o clero das igrejas estabelecidas não tem mais o controle que tinha na década de 1990. “Não é mais uma força unificadora … Os evangélicos são operações de pasta e não têm princípios de organização”, disse ele à BBC. A estudiosa de estudos religiosos Josephine Gitome observa que muitos fiéis podem não se incomodar tanto com o comportamento dos políticos. A maioria dos quenianos pode frequentar a igreja, mas não é tão religiosa no dia a dia: “Há uma preocupação se seu comportamento entre segunda e sábado coincide com seu comportamento no domingo.”

 

‘Falhas’ morais

A proibição do púlpito parece sinalizar que as igrejas tradicionais querem recuperar alguma autoridade moral. Anteriormente, os líderes da igreja tinham influência ao falar sobre assuntos públicos e sobre questões de direitos humanos – eles pressionaram por um retorno à democracia multipartidária na década de 1990. Mas a confiança do público diminuiu em relação às posições controversas assumidas nas últimas duas décadas.

O legislador da oposição Otiende Amollo acredita que as igrejas erraram o alvo em três ocasiões principais:

  • Por não falar com força suficiente no auge da violência pós-eleitoral entre 2007 e 2008
  • Ao se opor à nova constituição, introduzida após um referendo em 2010 para aliviar as tensões étnicas
  • E por não conseguir mediar entre as facções políticas depois que a Suprema Corte anulou os resultados das eleições presidenciais de agosto de 2017.

“Esses eventos reduziram significativamente a posição da Igreja e levará algum tempo para recuperá-la”, disse Amollo, que estava entre os advogados que convenceram os juízes a cancelar os primeiros resultados da votação de 2017, à BBC.

As restrições à pandemia foram parcialmente suspensas para as congregações da igreja em junho – embora as manifestações de campanha continuassem proibidas, o que significa que as igrejas foram inundadas com políticos. O presidente Uhuru Kenyatta, um católico praticante, recentemente diminuiu ainda mais as restrições, permitindo que as igrejas tenham até dois terços de sua capacidade, embora as manifestações ainda sejam proibidas. Portanto, a proibição do púlpito não se coaduna com políticos em campanha, como o vice-presidente William Ruto, que está de olho na presidência. “Viemos como cristãos para apoiar projetos da igreja”, disse ele em um culto evangélico no centro do Quênia, onde supostamente doou dois milhões de xelins quenianos (equivalente a US$18.000 dólares ou £13.000 libras esterlinas).

O Sr. Amollo acha que as igrejas deveriam ir mais longe e proibir os políticos de eventos de arrecadação de fundos também. Mas os líderes da igreja se esforçam para dizer que os próprios políticos que usam a Bíblia não estão proibidos. “Os políticos ainda são bem-vindos para orar, mas sem nenhum tratamento preferencial para se dirigir aos fiéis”, disse Ferdinand Lugonzo, chefe do secretariado da Conferência dos Bispos Católicos do Quênia, à BBC. “O prédio da igreja é consagrado apenas para fins de adoração.”

Fonte: BBC

Compartilhe este post:

Facebook
Twitter
WhatsApp
Telegram
Picture of Pregando pelo Mundo

Pregando pelo Mundo

Artigos do mesmo Autor

8 principais descobertas sobre os cristãos na Índia

8 principais descobertas sobre os cristãos na Índia

Alguns dizem que o cristianismo na Índia remonta aos primeiros seguidores de Jesus no primeiro século da era cristã. Hoje, há milhões de cristãos no país, embora representem apenas 2,4% da enorme população da Índia. O sul da Índia abriga cerca de metade dos cristãos do país, e os cristãos representam uma parcela relativamente grande da população do nordeste da Índia, que é mais escassamente povoada, onde a grande maioria dos cristãos pertence a comunidades tribais.

Aqui estão oito descobertas importantes sobre os cristãos na Índia, de acordo com um relatório recente do Pew Research Center .

A conversão é uma questão controversa na Índia, e nove estados promulgaram leis contra o proselitismo desde o início de 2021. Embora o cristianismo seja uma religião de proselitismo, muitas outras religiões na Índia não fazem proselitismo e a conversão religiosa é rara no país. No geral, apenas 2% dos entrevistados relatam uma religião diferente daquela em que foram criados, incluindo 0,4% que são convertidos ao cristianismo. Cristãos convertidos na Índia são em sua maioria ex-hindus, mas a pesquisa também descobriu que os hindus tendem a ganhar tantas pessoas quanto perdem por meio da mudança religiosa (0,7% dos entrevistados foram criados como hindus e agora se identificam como outra coisa, enquanto 0,8% foram criados como outra coisa, mas agora se identificam como hindus). Os convertidos cristãos na Índia estão desproporcionalmente localizados no sul, enquanto alguns também estão localizados no leste. A maioria dos convertidos diz que pertence a castas inferiores – isto é, eles se identificam com as castas (às vezes conhecidas como dalits), tribos ou outras classes atrasadas. A maioria dos conversos também vem de origens pobres – ou seja, relataram recentemente que lutaram para pagar a comida ou outras necessidades.



Embora muitos cristãos indianos se identificam como católicos (37%), uma variedade de outras denominações estão presentes na Índia . Por exemplo, 13% dos cristãos indianos são batistas, 7% se identificam com a Igreja do Norte da Índia e outros 7% se identificam com a Igreja do Sul da Índia.

Quase todos os cristãos indianos (98%) dizem que acreditam em Deus, e os cristãos na Índia são mais propensos do que a maioria das outras comunidades religiosas a dizer que oram diariamente (77%). A maioria dos cristãos indianos também vai à igreja semanalmente (55%), e uma parte esmagadora dá dinheiro para a igreja (89%). Ao mesmo tempo, embora 78% dos cristãos indianos digam que lêem ou ouvem a Bíblia pelo menos uma vez por semana, parcelas menores dizem que possuem várias crenças tradicionais enraizadas na Bíblia, incluindo a crença no Dia do Julgamento (49%) e milagres (48 %).

A maioria dos cristãos indianos afirma acreditar no carma (54%), que não está enraizado na religião cristã. E muitos cristãos indianos também acreditam na reencarnação (29%) e que o rio Ganges tem o poder de purificar (32%), sendo que ambos são ensinamentos fundamentais do hinduísmo. Também é um tanto comum para os cristãos indianos observar os costumes ligados a outras religiões, como celebrar o Diwali (31%) ou usar uma marca na testa chamada bindi (22%), mais frequentemente usada por mulheres hindus, budistas e jainistas. 

O sistema de castas da Índia é uma hierarquia social que pode ditar a classe e a vida social, incluindo com quem uma pessoa pode se casar. Hoje, independentemente de sua religião, os índios quase que universalmente se identificam com uma categoria de casta. Entre os cristãos, 33% se identificam como castas, enquanto 24% se identificam como tribos. E os cristãos são um pouco mais propensos do que a população indiana em geral a dizer que há discriminação generalizada de castas na Índia. Por exemplo, entre os indianos em geral, 20% dizem que há discriminação generalizada contra castas na Índia, em comparação com 31% entre os cristãos que dizem o mesmo. Uma parcela menor de cristãos (18%) diz que há muita discriminação contra os cristãos na Índia, e menos ainda dizem que enfrentaram pessoalmente discriminação recente com base em sua casta (11%) ou religião (10%).

Cristãos indianos que pertencem a castas, tribos e outras castas inferiores tendem a acreditar em anjos e demônios em taxas significativamente mais altas do que os Cristãos de casta superior. Por exemplo, cerca de metade dos cristãos de casta inferior (51%) acredita em demônios ou espíritos malignos, enquanto apenas 12% dos cristãos de casta superior têm essa crença. Os cristãos de casta inferior também são mais propensos do que os cristãos da categoria geral a acreditar em forças espirituais geralmente não associadas ao cristianismo, como carma (58% contra 44%) e o mau-olhado (33% contra 12%).

Por exemplo, os cristãos têm menos probabilidade do que outros grupos religiosos de dizer que interromper o casamento inter-religioso é muito importante. Entre os cristãos, 37% dizem que interromper o casamento inter-religioso de mulheres cristãs é muito importante, enquanto 35% dizem o mesmo sobre os homens cristãos. Em contraste, cerca de dois terços dos hindus e uma parcela ainda maior de muçulmanos dizem que é crucial impedir esses casamentos de homens e mulheres em suas respectivas comunidades. Além disso, menos cristãos (22%) do que hindus (47%) e muçulmanos (45%) dizem que todos seus amigos próximos compartilham sua religião. Em parte, essas atitudes podem refletir a concentração regional dos cristãos no Sul, onde a oposição ao casamento inter-religioso é geralmente menos difundida e a segregação religiosa em geral é menos pronunciada.

Que é liderado pelo primeiro-ministro Narendra Modi e é frequentemente  descrito como promotor de uma ideologia nacionalista hindu . Uma pluralidade de eleitores cristãos (30%) afirma ter votado no INC nas eleições parlamentares de 2019, o que corresponde à proporção de muçulmanos e sikhs que votaram no INC. Apenas um em cada dez eleitores cristãos indianos dizem que votou no BJP em 2019, a menor proporção entre todos os principais grupos religiosos da Índia. Mais uma vez, os padrões de votação dos cristãos na Índia refletem as preferências políticas dos indianos do sul em geral. Nas eleições parlamentares de 2019, o BJP recebeu sua menor parcela de votos no Sul, incluindo entre os hindus; muitas pessoas no sul, incluindo cristãos, votaram em partidos regionais.

Fonte: Pew Research Center

Compartilhe este post:

Facebook
Twitter
WhatsApp
Telegram
Picture of Pregando pelo Mundo

Pregando pelo Mundo

Artigos do mesmo Autor

Dinamarca pode forçar igrejas a traduzirem sermões e apresentarem ao governo

Dinamarca pode forçar igrejas a traduzirem sermões e apresentarem ao governo

A comunidade anglicana na Dinamarca gira em torno da Igreja de St. Albans, do início do século XIX, no Parque Churchill de Copenhague. Fotografia: Equipe da Reuters / Reuters

As liberdades da centenária comunidade anglicana na Dinamarca estão sendo ameaçadas por um projeto de lei que exige que todos os sermões sejam traduzidos e submetidos ao Estado, segundo informou o bispo da Igreja da Inglaterra, na Europa.

Robert Innes, cuja diocese se estende pela Europa Continental, escreveu ao primeiro-ministro dinamarquês, Mette Frederiksen, expressando seu alarme com o que ele descreve como um vínculo “excessivamente restritivo” à liberdade de expressão.

A comunidade anglicana de “várias centenas de pessoas” na Dinamarca gira em torno da Igreja de St. Albans, do início do século XIX, no Parque Churchill de Copenhagen, projetada por Arthur Blomfield no estilo de uma igreja paroquial inglesa.

O parlamento dinamarquês deve debater a legislação, conhecida como a lei sobre sermões em outras línguas que não o dinamarquês, nos próximos dias, depois que o governo disse que era necessário conter o crescimento do extremismo islâmico.

Innes disse ao The Guardian que temia que a lei, se apoiada no parlamento dinamarquês (Folketing), fosse reproduzida em outros lugares da Europa, em um momento em que as minorias religiosas estavam geralmente tendo suas liberdades sendo violadas.

“Tenho certeza de que vem de uma preocupação genuína com a segurança da propriedade e o monitoramento de todas as minorias religiosas que podem ser percebidas como um risco à segurança”, disse Innes. “Compartilho a ambição do governo dinamarquês de garantir a segurança e proteção e o desejo de que todas as organizações religiosas na Dinamarca conduzam seus atos pacificamente, mas exigir que os sermões sejam traduzidos para a língua nacional, vai longe demais. Vai em uma direção anti-liberal preocupante”, disse o bispo.

“Em uma sociedade democrática, espero que o governo se esforce por uma melhor cooperação com as organizações religiosas do que recorrer a leis que interfiram em suas liberdades”, afirmou Innes.

“Esta é a primeira vez que é tão importante encontrarmos uma maneira de abordar e encorajar o governo dinamarquês a encontrar outra solução. Porque minha verdadeira preocupação é que, se os dinamarqueses fizerem isso, outros países poderão copiar. Isso seria realmente um desenvolvimento muito preocupante”, desabafou o religioso.

O governo disse que o objetivo da lei é “aumentar a transparência dos eventos religiosos e sermões na Dinamarca, quando estes são proferidos em um idioma diferente do dinamarquês”.

Há um nível crescente de preocupação com o aumento percebido do extremismo islâmico entre os 270 mil muçulmanos que vivem na Dinamarca. A maioria dos sermões pregados nas mesquitas é em árabe. Mas Innes disse que o governo dinamarquês deveria trabalhar com organizações religiosas ao invés de recorrer a um ataque “negativo e legalista” aos direitos dos grupos minoritários.

O bispo disse que não estava claro se a lei exigiria que as traduções fossem enviadas ao governo antes ou depois de serem entregues, mas que em ambos os casos era uma restrição ilegítima e pouco prática.

Ele disse: “Os pregadores nem sempre escrevem o texto completo de seus sermões, eles podem escrever notas. Eles podem pregar de improviso como o arcebispo de Canterbury às vezes faz e há questões de idioma e nuance que requerem um alto nível de habilidade na tradução, é claro. É um padrão alto. É uma arte habilidosa e também cara”, explicou.

Uma série de igrejas europeias também expressou suas preocupações, incluindo a Igreja Evangélica Luterana na Dinamarca, a Federação Luterana Mundial, a Comissão Católica Romana das Conferências Episcopais da União Europeia e a Conferência das Igrejas Europeias.

Innes disse que há uma tendência preocupante de atingir grupos minoritários em toda a Europa. “Há uma grande preocupação com isso. Estou genuinamente preocupado com o que considero ser um crescimento de uma legislação governamental anti-liberal e ameaças à liberdade de religião na Europa como um todo”, acrescentou o bispo.

“Este não é um incidente isolado. Acho que precisamos estar alertas à invasão de nossa liberdade de praticar nossas religiões. Aos poucos, grupos minoritários estão sendo tratados com suspeita crescente”, avaliou.

“Por exemplo, na Suíça, nosso clero foi informado de que não pode trabalhar meio período, só pode trabalhar em período integral, porque há uma suspeita do que eles possam estar fazendo na outra metade de seu tempo. Na França, os grupos religiosos minoritários são obrigados a ter suas contas sujeitas a uma investigação particularmente invasiva e a se registrar novamente como associações religiosas a cada cinco anos”, disse Innes.

“Eu acho que no geral há uma suspeita de pessoas usarem línguas que não são as línguas nativas do país em questão e que está em violação do artigo 9º da convenção de liberdade de pensamento, comentário e religião, que garante que as pessoas se manifestem sua própria religião e crença na prática e observância do ensino de adoração, que deve incluir a liberdade de culto em sua língua materna”, finalizou.



Fonte: The Guardian

Compartilhe este post:

Facebook
Twitter
WhatsApp
Telegram
Picture of Pregando pelo Mundo

Pregando pelo Mundo

Artigos do mesmo Autor